Pular para o conteúdo principal

O preso que trabalha, pode ser considerado como um empregado?

O trabalho da pessoa presa dentro do estabelecimento prisional está relacionado à execução da pena e tem finalidade educativa e ressocializadora e, por isto, trata-se de relação essencialmente vinculada ao direito penal. Com este fundamento, a Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho declarou a incompetência da Justiça do Trabalho para julgar ação trabalhista movida por um presidiário de Pernambuco. O processo será remetido à Vara Criminal competente.

O autor da reclamação foi condenado em 2002 a pena de 18 anos de reclusão, inicialmente em regime fechado, na Penitenciária Professor Barreto Campelo, em Itamaracá (PE), onde trabalhou durante 310 dias na horta da instituição. Em 2007, já em regime semi-aberto na Penitenciária Agroindustrial São João, também em Itamaracá, moveu ação trabalhista contra o Estado de Pernambuco em que pedia o pagamento dos dias trabalhados, no total de R$ 5.890,00.

Na inicial, seu advogado alegava que, de acordo com a Lei de Execuções Penais, a remuneração do trabalho deve atender à indenização dos danos causados pelo crime, à assistência da família, a pequenas despesas pessoais e ao ressarcimento do Estado das despesas com a manutenção do condenado. A parte restante deve ser depositada em caderneta de poupança a ser entregue ao preso quando posto em liberdade. “O Judiciário não pode ser partícipe dessa situação, ainda mais quando a Constituição garante a todos o direito à dignidade, à isonomia, à cidadania, à função social da economia, à proibição da discriminação”, sustentou o advogado, “tudo à luz do princípio da dignidade humana”.

A 22ª Vara do Trabalho do Recife (PE) acolheu preliminar de incompetência da Justiça do Trabalho e determinou a remessa do processo à Justiça Estadual. Mas o Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (PE), ao julgar recurso ordinário, rejeitou a incompetência e remeteu o processo de volta à Vara do Trabalho, para julgamento. O Estado de Pernambuco interpôs então recurso de revista para o TST, no qual sustentou que o serviço prestado pelo presidiário não configura relação de trabalho, uma vez que o preso não tem liberdade de contratar e que seu trabalho é “dever social com finalidade educativa e de remição da pena”. Alegou, ainda, que a Lei de Execuções Penais afasta a aplicabilidade da CLT e determina a competência do Juízo de Execuções Penais – e, portanto, da Justiça Estadual.

Numa análise detalhada da matéria, o relator, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, lembrou que a definição da relação de trabalho capaz de justificar a competência da Justiça do Trabalho depende não só de elementos intrínsecos às atividades exercidas pelo “trabalhador” (ou seja, não basta apenas existir a prestação de trabalho), mas, também, devem ser observadas outras circunstâncias. Como exemplo, citou o servidor público estatutário, que mantém relação de trabalho com entes públicos mas está fora da jurisdição trabalhista.

Para o relator, o ideal seria, na ressocialização do preso, aplicarem-se as normas da CLT, e com isso ser o trabalhador preso igual a um em liberdade, inclusive quanto ao julgamento das ações trabalhistas. “Seria mais eficaz, não haveria exploração do preso e, em sentido contrário, protegeria também o trabalho do ‘homem livre’ e haveria contribuições previdenciárias e fiscais. Mas, para isso, seria necessária uma reforma legislativa”, concluiu. (RR 1072/2007-011-06-40.4)

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Diferenças entre as Pertenças e as Benfeitorias, frente ao Código Civil.

Matéria aparentemente pacificada no Direito Civil – PERTENÇAS – mas pouco consolidada em detalhes. Apuramos diversos autores, e vamos apresentar as características da pertinencialidade, para podermos diferenciar de um instituto muito próximo, chamado BENFEITORIAS. O Código Civil de 2020 define-a pelo Art. 93, verbis : “São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro”. Se pegarmos os códigos comparados que foram feitos após o NCC, os autores apontam que não há um paralelo com o CC/1916, mas Maria Helena Diniz informa que há sim, dizendo estar no art. 43, inciso III, que declara: “São bens imóveis: (...). Tudo quanto no imóvel o proprietário mantiver intencionalmente empregado em sua exploração industrial, aformoseamento, ou comodidade”. E a professora ainda diz que o artigo 93 faz prevalecer no Direito Civil atual, o instituto da acessão intelectual. Mas isso é para outro arti

Cuidados em uma conciliação trabalhista (CNJ)

O CNJ – Conselho Nacional de Justiça, por meio da Resolução 586/2024, mostrou que os acordos trabalhistas durante o ano de 2023 tiveram, em média, valores superiores a 40 salários-mínimos. Saindo dessa “fofoca” boa, a citada Resolução trata dos acordos homologados em face dos arts. 855-B a 855-E da CLT - Consolidação das Leis do Trabalho (que trata do Processo de Jurisdição Voluntária para Homologação de Acordo Extrajudicial). E ficou resolvido o seguinte: “Os acordos extrajudiciais homologados pela Justiça do Trabalho terão efeito de quitação ampla, geral e irrevogável, nos termos da legislação em vigor, sempre que observadas as seguintes condições: I – previsão expressa do efeito de quitação ampla, geral e irrevogável no acordo homologado; II – assistência das partes por advogado(s) devidamente constituído(s) ou sindicato, vedada a constituição de advogado comum; III – assistência pelos pais, curadores ou tutores legais, em se tratando de trabalhador(a) menor de 16 anos ou

Novidades sobre o foro de eleição em contratos, trazidas pela Lei 14.879, de ontem (4 de junho de 2024)

O Código Civil, quando trata do foro de eleição, explica, no artigo 78, que “nos contratos escritos, poderão os contratantes especificar domicílio onde se exercitem e cumpram os direitos e obrigações deles resultantes”. Acerca deste tema, ontem houve uma alteração no Código de Processo Civil, em especial no artigo 63, sobre a competência em razão do lugar, para se ajuizar as ações em que existem o domicílio de eleição. Alterou-se o § 1º e acrescentou-se um §5º. Vejamos como era e como ficou: “Art. 63. As partes podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obrigações. § 1º A eleição de foro só produz efeito quando constar de instrumento escrito e aludir expressamente a determinado negócio jurídico. § 1º A eleição de foro somente produz efeito quando constar de instrumento escrito, aludir expressamente a determinado negócio jurídico e guardar pertinência com o domicílio ou a residência de uma das pa