Pular para o conteúdo principal

NA CONTRAMÃO

Na palestra de segunda-feira de manhã, no Fórum Jurídico do UniToledo, o Desembargador Federal do Trabalho Mário Bottazzo afirmou que o STF decidiu (e é verdade) que não existem mais servidores celetistas no Brasil, por força da declaração de inconstitucionalidade do art. 39, caput, da CF, alterado pela EC 19.

No entanto, o Tribunal Regional de Trabalho de Campinas continua entendendo diferente, pois, ante uma votação unânime da sua 9ª Câmara, o Município de Bragança Paulista foi condenado a pagar aviso prévio indenizado e multa fundiária de 40% a trabalhadora contratada para cargo em comissão pelo regime celetista e que foi demitida sem justa causa.

A decisão reformou a sentença do juízo da Vara do Trabalho (VT) de Bragança Paulista, que havia declarado improcedentes as pretensões da reclamante, por entender que a exoneração de quem exerce cargo público de provimento em comissão não pode ficar sujeita às regras da CLT.

Em seu recurso ordinário, a trabalhadora insistiu em que, ao contratar pelo regime celetista, o Município equiparou-se ao empregador privado, sujeitando-se às regras da CLT e não estando, pois, isento do pagamento das parcelas em questão.

O voto do relator do acórdão, juiz convocado Valdevir Roberto Zanardi, ponderou que, embora não haja dúvidas quanto à natureza transitória dos cargos comissionados – em razão da presunção de sua extinção ao término do mandato do governante, por se tratar de cargos da confiança do administrador –, o inciso II do artigo 37 da Constituição Federal de 1988, que autoriza as nomeações para “cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”, não faz qualquer referência à modalidade de sua contratação – se por prazo determinado ou indeterminado – e tampouco dispõe sobre a possibilidade de fazê-lo pelo regime celetista. Sendo assim, argumentou o magistrado, quando a portaria de nomeação não discrimina o período de vigência do contrato, não há como se afastar a hipótese de contratação por tempo “indeterminado”, uma vez que o contrato tanto pode durar o período máximo da Administração contratante (até quatro anos), como pode encerrar-se, a critério do administrador, dentro de curto período, ou mesmo – hipótese remota, porém real – prorrogar-se pelo próximo governo, a critério do novo administrador.

O juiz relator chegou a reconhecer a possibilidade de presunção da predeterminação do prazo em casos como esse, apesar de silente a portaria de nomeação. Tal presunção, explicou, estaria alicerçada no fato de que o pessoal nomeado para cargos comissionados teria plena ciência da transitoriedade do contrato, cuja vigência perduraria, em tese, até o término do mandato governamental, ou mesmo antes, se houver perda da confiança depositada. No entanto, o magistrado advertiu que “essa concepção, diante da opção de se contratar pela CLT, sem expressa predeterminação de prazo, encontra barreira na própria legislação laboral, uma vez que o artigo 445 da CLT prevê que o contrato de trabalho por prazo determinado não poderá ser estipulado por mais de dois anos, observada a regra do artigo 451, que permite sua prorrogação por uma vez”. Para o juiz, presumir a contratação direta pelo período integral do mandato político (quatro anos) implica “a violação à citada norma celetista e, via de conseqüência, a descaracterização do contrato a termo, limitado que está ao período de dois anos”.
Zanardi argumentou ainda que, em que pese ser possível a dispensa ad nutum (ao arbítrio do contratante) dos ocupantes de cargos em comissão, conforme prevê o artigo 37 da Constituição Federal, “não se pode entender que esse desligamento se faça sem a respectiva paga do aviso prévio e dos 40% ‘fundiários’, até porque, para a CLT, salvantes as raras hipóteses de estabilidade, todas as dispensas são ad nutum do empregador e, em todas elas, são devidas tais parcelas”.

Seguindo a posição do juiz relator, a conclusão unânime da 9ª Câmara foi de que, se a Constituição não proíbe que se contrate para cargo em comissão pelo regime da CLT, em sendo esta a opção do administrador estará ele obrigado a seguir as regras trabalhistas, inclusive no tocante à concessão de aviso prévio. “Como corolário, a dispensa do trabalhador comissionado, a qualquer tempo dentro desse período indefinido de contratação, quando não motivada, revela-se arbitrária e, portanto, confere o direito à multa fundiária de 40%, nos exatos termos do artigo 7º, inciso I, da Constituição, e artigo 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).”

Por fim, os magistrados observaram que discussões judiciais dessa natureza poderiam ser evitadas se a norma constitucional do artigo 37, inciso II, fosse regulamentada no âmbito municipal, estabelecendo-se casos e critérios específicos de nomeação para cargos em comissão, inclusive afastando expressamente a possibilidade de contratação pelo regime da CLT, a exemplo do que fez o legislador federal através da Lei 9.962/2000. (Processo 1169-2006-038-15-00-1 RO)

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Diferenças entre as Pertenças e as Benfeitorias, frente ao Código Civil.

Matéria aparentemente pacificada no Direito Civil – PERTENÇAS – mas pouco consolidada em detalhes. Apuramos diversos autores, e vamos apresentar as características da pertinencialidade, para podermos diferenciar de um instituto muito próximo, chamado BENFEITORIAS. O Código Civil de 2020 define-a pelo Art. 93, verbis : “São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro”. Se pegarmos os códigos comparados que foram feitos após o NCC, os autores apontam que não há um paralelo com o CC/1916, mas Maria Helena Diniz informa que há sim, dizendo estar no art. 43, inciso III, que declara: “São bens imóveis: (...). Tudo quanto no imóvel o proprietário mantiver intencionalmente empregado em sua exploração industrial, aformoseamento, ou comodidade”. E a professora ainda diz que o artigo 93 faz prevalecer no Direito Civil atual, o instituto da acessão intelectual. Mas isso é para outro arti...

TEMA 1118 STF (TERCEIRIZAÇÃO E O ESTADO: RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA A UM PASSO DO FIM)

O STF - Supremo Tribunal Federal está para decidir um caso sobre ônus da prova em terceirização de serviços, feito pelo Estado. O Estado cada vez mais terceiriza suas funções, contratando empresas que, em algumas situações, não pagam seus funcionários, deixando um passivo trabalhista a ser discutido no Judiciário. O Judiciário (leia-se TST – Tribunal Superior do Trabalho) vem decidindo que, havendo culpa “in vigilando”, o Estado (tomador de serviços) é responsável subsidiário nas dívidas, junto à empresa terceirizada. Pois bem. Agora está no STF um processo, já com Repercussão Geral admitida, em que se discute quem tem que provar se o Estado foi omisso ou não na fiscalização do terceiro, se este estava pagando ou não os funcionários, recolhendo FGTS, INSS, etc. O cenário então é este: se a Suprema Corte decidir que o ônus da prova é do trabalhador, estaremos diante de uma prova diabólica, impossível de ser feita, já que o portal da transparência só mostra que o Estado pagou a t...

Cuidados em uma conciliação trabalhista (CNJ)

O CNJ – Conselho Nacional de Justiça, por meio da Resolução 586/2024, mostrou que os acordos trabalhistas durante o ano de 2023 tiveram, em média, valores superiores a 40 salários-mínimos. Saindo dessa “fofoca” boa, a citada Resolução trata dos acordos homologados em face dos arts. 855-B a 855-E da CLT - Consolidação das Leis do Trabalho (que trata do Processo de Jurisdição Voluntária para Homologação de Acordo Extrajudicial). E ficou resolvido o seguinte: “Os acordos extrajudiciais homologados pela Justiça do Trabalho terão efeito de quitação ampla, geral e irrevogável, nos termos da legislação em vigor, sempre que observadas as seguintes condições: I – previsão expressa do efeito de quitação ampla, geral e irrevogável no acordo homologado; II – assistência das partes por advogado(s) devidamente constituído(s) ou sindicato, vedada a constituição de advogado comum; III – assistência pelos pais, curadores ou tutores legais, em se tratando de trabalhador(a) menor de 16 anos ou ...