A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afastou tese do
Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) segundo a qual a caracterização do
acidente de trabalho, por si só, inviabiliza a indenização securitária pelo
DPVAT. O colegiado decidiu devolver ao TJMT um processo que discute se é devida
a indenização do seguro em acidente envolvendo colheitadeira, para que sejam
esclarecidas as circunstâncias do acidente e a possibilidade de o veículo
trafegar em via pública.
“No caso em julgamento, apesar de constar que se trata de acidente com
colheitadeira, não há como aferir se a máquina preenchia as condições mínimas
para a circulação em via pública”, afirmou o relator, ministro Luis Felipe Salomão.
A vítima do acidente ajuizou ação de cobrança de seguro obrigatório
contra Tókio Marine Seguradora S/A afirmando que sua mão direita foi esmagada
em acidente com máquina colheitadeira, com posterior reconhecimento de
deformidade permanente.
A primeira instância condenou a seguradora ao pagamento de R$ 13.500,
com incidência de juros de mora a partir da citação e correção monetária a
partir da propositura da ação.
Sem licença
O TJMT, em apelação, extinguiu a ação por entender que o acidente não se
enquadra na Lei 6.194/74, que instituiu o DPVAT.
A concepção dessa modalidade de seguro teve como finalidade, nos termos
da exposição de motivos do projeto que deu origem à Lei 6.194/1974, "dar
cobertura à responsabilidade civil decorrente do uso de veículos, garantindo a
reparação de danos a que a sociedade está sujeita por força do intenso tráfego
que o progresso torna inevitável".
Segundo o TJMT, o acidente está relacionado a máquina não licenciada nem
registrada no órgão competente. “O sinistro ocorreu no exercício de atividade
laboral e não em razão de acidente de trânsito”, concluiu o tribunal,
concluindo que isso “evidencia falta de interesse processual do apelado, pois
seu pedido, embora juridicamente possível, não está amparado na Lei 6.194”.
No STJ, a vítima sustentou que a lei exige para a cobertura do seguro
obrigatório tão somente que o acidente tenha advindo de veículo automotor de
via terrestre, sendo irrelevante que tenha ocorrido em trânsito ou em
decorrência do trabalho.
Alegou ainda que é admitido, inclusive, "o chamado autoacidente, ou
seja, aquele em que a vítima sofre determinado acidente causado por veículo,
sem a interferência de terceiro, ao entendimento de que o veículo, em hipóteses
tais, é mero instrumento provocador do acidente".
Jurisprudência
Jurisprudência
Em seu voto, o ministro Salomão afastou a tese principal adotada pelo
tribunal estadual, segundo a qual haveria falta de interesse processual por se
tratar de acidente no exercício de trabalho e não de acidente de trânsito. Isso
porque a jurisprudência do STJ considera que a caracterização do fato como
acidente de trabalho não afasta obrigatoriamente a cobertura do seguro DPVAT.
Entretanto, o ministro afirmou que não é possível simplesmente restaurar a sentença. É que, apesar de reconhecidos o nexo de causalidade e a invalidez permanente pelo TJMT, trata-se de acidente com veículo agrícola, o que, segundo ele, leva a outras reflexões.
“Não é qualquer infortúnio atinente a veículos automotores que enseja o
direito ao recebimento do seguro obrigatório, mas somente as intercorrências
que causem danos advindos funcionalmente de determinada atividade de transporte
de pessoas ou cargas”, destacou Salomão.
O ministro ressaltou que o STJ já reconheceu que os sinistros que
envolvem veículos agrícolas também podem estar cobertos pelo DPVAT. Entretanto,
apesar de a colheitadeira ser também veículo automotor agrícola, não se pode
sempre enquadrá-lo como trator para fins de indenização pelo DPVAT.
Normas para circulação
“É bem verdade que, apesar de não se exigir que o acidente tenha
ocorrido em via pública, o automotor deve ser, ao menos em tese, suscetível de
circular por essas vias; isto é, caso a colheitadeira, em razão de suas
dimensões e peso, jamais venha a preencher os requisitos normativos para fins
de tráfego em via pública, não há como reconhecer a existência de fato gerador
de sinistro protegido pelo seguro DPVAT, apesar de se tratar de veículo
automotor”, afirmou.
O ministro comentou que há pequenas colheitadeiras de grãos que, em
razão de suas medidas, são plenamente capazes de circular nas estradas, nos
moldes de um trator convencional, saindo da proibição da Resolução 210/06 do
Conselho Nacional de Trânsito (Contran).
De acordo com o ministro, será necessário avaliar, no caso julgado, a
possibilidade de licenciamento e registro do veículo agrícola para circulação
em vias públicas. Por isso ele determinou o retorno dos autos ao TJMT, para que
descreva com maior riqueza de detalhes as circunstâncias do acidente, bem como
defina, diante das provas, se a colheitadeira era suscetível de trafegar por
via pública, para então apreciar integralmente a apelação.
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