A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) restringiu o alcance
de decisão que obrigou o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a computar
o tempo de benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez) como período de carência. Seguindo o voto do relator, ministro
Rogerio Schietti Cruz, a Turma deu parcial provimento ao recurso do INSS e
determinou que a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4),
sediado em Porto Alegre, tenha efeitos apenas na Região Sul, área de sua
jurisdição.
A carência é o tempo mínimo de contribuição que o
trabalhador precisa comprovar para ter direito a um benefício previdenciário e
varia de acordo com benefício solicitado.
Na origem, o Ministério Público ajuizou uma ação civil pública em Porto
Alegre para que fossem promovidas as modificações necessárias no texto da
Instrução Normativa INSS/PRES 20/2007, cujo teor foi repetido na IN INSS/PRES
45/2010, atualmente em vigor.
A norma diz que “não será computado como período de carência o período
em que o segurado está ou esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez, inclusive decorrente de acidente do trabalho ou de qualquer
natureza, salvo os períodos entre 1º de junho de 1973 e 30 de junho de 1975 em
que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença previdenciário ou aposentadoria
por invalidez previdenciária”.
Abrangência
Em primeiro grau, o processo foi extinto sem julgamento de mérito em
razão de suposta ilegitimidade do Ministério Público Federal para propor a
ação. Já em grau de apelação, no TRF4, a ação foi julgada parcialmente
procedente, possibilitando o cômputo, para fins de carência, dos períodos de
aposentadoria por invalidez e auxílio doença, desde que intercalados com
períodos de efetivo trabalho ou contribuição.
Para o tribunal regional, por conta da própria natureza do pedido, não
seria possível restringir os efeitos da decisão a uma determinada circunscrição
territorial, “uma vez que se trata do reconhecimento de que o disposto em uma
norma administrativa expedida pelo INSS em âmbito nacional contraria a
legislação previdenciária e, por isso, deve ser alterada”.
Houve interposição de recurso especial (ao STJ) e extraordinário (ao
Supremo Tribunal Federal), mas como não foi dado efeito suspensivo a tais
recursos, o MPF requereu a execução provisória do acórdão, com abrangência
nacional. O INSS calcula que a interpretação dada pelo TRF4 resultaria numa
despesa adicional de R$ 10,74 bilhões nos próximos dez anos.
A autarquia previdenciária contestou o pedido de execução, mas o juízo
determinou o cumprimento da obrigação no prazo de 40 dias, sob pena de multa
diária de R$ 5 mil. O INSS ainda recorreu ao TRF4 contra a decisão que mandou
executar sem o recolhimento de caução por parte do MPF, mas o tribunal manteve
a ordem, apenas reduzindo a multa para R$ 1 mil.
Competência territorial
Daí o recurso julgado na Sexta Turma do STJ. Em seu voto, o ministro
Schietti destacou que prevalece no tribunal o entendimento de que a sentença em
ação civil pública “fará coisa julgada erga omnes nos limites
da competência territorial do órgão prolator, nos termos do artigo 16 da Lei 7.347/85,
alterado pela Lei 9.494/97”. Assim, como foi tomada pelo TRF4, a decisão tem
validade para os estados da 4ª Região – Rio Grande do Sul, Santa Catarina e
Paraná.
A Turma ainda confirmou a possibilidade de execução nessa fase
processual, quando não houver efeito suspensivo nos recursos pendentes de
julgamento. Para os ministros, o MPF é o autor da ação civil pública e age no
exercício regular da tutela dos direitos difusos e coletivos ao querer executar
a condenação, ainda que sem trânsito em julgado. Os magistrados entenderam que
se trata de uma obrigação de fazer.
Precedentes
Quanto ao ponto principal do recurso, o ministro Schietti destacou que
há decisão de 2014 da Segunda Turma no mesmo sentido da decisão do TRF4, de que
é possível “a consideração dos períodos em que o segurado esteve em gozo de
auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez como carência para a concessão
de aposentadoria por idade, se intercalados com períodos contributivos” (REsp 1.422.081).
Assim, afirmou Schietti, somente quando não há o retorno do segurado ao
exercício de atividade remunerada no período básico de cálculo é que se veda a
utilização do tempo respectivo para fins de carência.
O ministro relator mencionou ainda que a Primeira Seção (atualmente
competente para julgar matéria previdenciária) decidiu em julgamento de recurso
repetitivo (REsp 1.410.433)
que “o cômputo dos salários de benefício como salários de contribuição somente
será admissível se no período básico de cálculo houver afastamento intercalado
com atividade laborativa, em que há recolhimento da contribuição
previdenciária.”
O relator explicou que, “se o período em que o segurado esteve no gozo
de benefício por incapacidade é excepcionalmente considerado como tempo ficto
de contribuição, não se justifica interpretar a norma de maneira distinta para
fins de carência”.
Comentários