Aplicação do artigo 474 do Código Civil na devolução da moradia pelo empregado, em razão da cessação do contrato de trabalho
Nas
relações de emprego, quando um trabalhador recebe o direito de residir em um
imóvel cedido pelo empregador, estará estabelecido entre as partes um negócio
jurídico condicional, ou seja, de forma resolutiva, o empregado permanecerá no
imóvel enquanto houver emprego.
Deste
modo, findo o contrato de trabalho, terminado está o direito de continuar
morando naquela habitação.
A
CLT, bem como a lei do trabalho rural, tratam do tema conforme artigos abaixo
descritos:
CLT
Art. 458 - Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos
os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações
"in natura" que a empresa, por fôrça do contrato ou do costume,
fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o pagamento
com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas.
Pela
Lei do Trabalho Rural (nº 5589/73), em seu artigo 9º, há expressa previsão de
entrega de habitação ao empregado, como se verifica do § 5º, verbis: “A cessão
pelo empregador, de moradia e de sua infra estrutura básica, assim, como, bens
destinados à produção para sua subsistência e de sua família, não integram o
salário do trabalhador rural, desde que caracterizados como tais, em contrato
escrito celebrado entre as partes, com testemunhas e notificação obrigatória ao
respectivo sindicato de trabalhadores rurais”.
Todavia,
analisando o Código Civil, verificamos que os negócios jurídicos que têm
cláusulas acidentais, como é a condição, merecerá uma atenção maior das partes,
no que tange à moradia do empregado, em especial diante de quebras de contrato
de emprego de forma inesperada. Vejamos.
O artigo 121 do
Código Civil determina que a condição é uma modalidade que subordina os efeitos
do negócio (contrato de trabalho) a um evento futuro e incerto, ou seja, não se
aplica este artigo quando estamos diante de um contrato de prazo determinado,
pois daí será “termo”, na linguagem civilista dos elementos acidentais do
negócio jurídico, haja vista que estaríamos diante de um evento futuro e certo.
Pois bem. O problema
da moradia em contratos de trabalho por prazo indeterminado está na situação
prevista no artigo 122 do Código Civil, ou seja, no impedimento de ser
estabelecida uma condição que se sujeitar “ao puro arbítrio de uma das partes”,
isto é, a uma cláusula puramente postestativa, que a lei civil não tolera.
O que se quer
dizer aqui é que o Direito Civil não permite o estabelecimento de um direito
potestativo puro, chamado também de cláusula leonina, onde uma das partes tem
total arbítrio na decisão, sem qualquer participação da parte contrária no
acordo.
No entanto,
entendemos que o contrato de emprego é quem gera o direito de moradia, sendo um
acessório portanto. A habitação decorre do emprego. Assim, em uma decisão do
empregador de resolver um contrato de emprego, sem justa causa, está dentro de
seu direito potestativo. Não o puro, mas o relativo, onde haverá uma
contraprestação do empregador, que é o pagamento das verbas rescisórias, e
multa do FGTS.
Todavia, deverá
o trabalhador desocupar de imediato a sua atual moradia, que possui em razão do
trabalho?
O artigo 128 do
Código Civil nos auxilia. Eis a redação: “Sobrevindo a condição resolutiva, extingue-se, para todos os efeitos, o
direito a que ela se opõe; mas, se aposta a um negócio de execução continuada
ou periódica, a sua realização, salvo disposição em contrário, não tem eficácia
quanto aos atos já praticados, desde que compatíveis com a natureza da condição
pendente e conforme aos ditames de boa-fé”.
Logo, a saída do
empregado da residência – pela dicção do artigo acima – deverá ser imediata, já
que a resolução contratual do emprego extingue os efeitos do contrato, de
pronto.
No entanto (e
sempre tem um “entretanto”), vem o disposto no artigo 474 do Código Civil e
determina que “a cláusula resolutiva
expressa opera de pleno direito; a tácita depende de interpelação judicial”.
Com efeito, se no contrato de trabalho não for disciplinado por escrito que o
empregado deverá desocupar o imóvel da data final do aviso prévio, o empregador
necessitará interpelar judicialmente o empregado, para sair da moradia que lhe
foi cedida.
Aliás, esta interpretação está em consentâneo com o princípio
da proteção, já que mais benéfico ao trabalhador, que foi demitido sem justo
motivo, e às vezes o empregador ainda determina o pagamento do aviso prévio de
forma indenizada, a fim de ocorrer a desocupação de imediato.
Por fim, quanto
à parte final do artigo 128 do Código Civil, este trata do efeitos nos negócios
de execução continuada, como é o emprego, que se opera mês a mês. Nada aqui se
aplica ao caso em análise, mas importante checar a regra acima apenas para
esclarecer que a questão – aqui – é se os efeitos serão “ex nunc” ou “ex tunc”,
e neste caso é “ex nunc”, em regra, pois o passado está mantido.
Para melhor compreensão,
o empregador não tem que devolver nenhum valor ao empregado, a título de salário
“in natura”, já que o empregado residiu efetivamente no imóvel cedido. Se fosse
efeito “ex tunc”, pela leitura da regra acima, apesar do empregado ter residido
no imóvel cedido pelo empregador, em razão do contrato de trabalho, ainda teria
o empregador que devolver aquilo que foi descontado do empregado, a título de
remuneração, já que as partes teriam que devolver o bem no “status quo ante”.
Em conclusão, a
moradia cedida pelo empregador ao empregado cessará de imediato, quando houver
rompimento contratual, sem justa causa, em face do direito potestativo da
empresa. Todavia, a saída do trabalhador do imóvel poderá ocorrer ao término do
aviso prévio, se tal previsão estiver expressa no contrato de emprego, ou via
interpelação judicial, no caso do contrato não prever esta situação, como
determina o artigo 474 do Código Civil.
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