A Quarta Turma do Tribunal Superior do
Trabalho (TST) não conheceu de recurso contra decisão da Justiça do
Trabalho da 12ª Região (SC) que extinguiu a execução de uma sentença
trabalhista de quase R$ 1 milhão por entender que houve conluio entre as
partes para fraudar interesses da Fazenda Pública. A Turma rejeitou a
alegação de que parte das provas – o registro de intensa troca de
telefonemas entre as partes – seria ilícita por violação ao artigo 5º,
inciso XII, da Constituição da República,
que garante a inviolabilidade da correspondência e das comunicações
telefônicas, uma vez que não houve escuta ou gravação das ligações.
Na reclamação trabalhista, um ex-empregado de um estabelecimento
comercial de Florianópolis (SC) reclamava diversas verbas trabalhistas –
entre elas um número bastante elevado de horas extras, embora afirmasse
que exercia a função de gerente. A empresa não compareceu à audiência
nem apresentou defesa, e a sentença condenou-a a revelia. Os valores das
horas extras, à época da execução, chegavam a R$ 878 mil.
Conluio
Na fase de execução, o Ministério Público do Trabalho (MPT) foi
informado pela Procuradoria da Fazenda Nacional da existência de
diversos créditos tributários inscritos na Fazenda Pública Nacional
contra a empresa, que não conseguia executá-los porque a maioria dos
seus bens e de seu responsável tributário estava penhorada na Justiça do
Trabalho em nome do ex-gerente. Essa dívida trabalhista, resultante da
condenação à revelia, era maior do que todos os bens da empresa,
tornando-a insolvente.
Os débitos
com a Fazenda Nacional, conforme apurado pelo MPT, chegavam a R$ 244 mil
em agosto de 2004, além de dívidas de tributos estaduais e municipais.
Todas elas ficariam prejudicadas pela execução dos créditos
trabalhistas, que, devido a sua natureza alimentar, têm preferência
sobre os demais.
Troca de telefonemas
Diante disso, o juiz da 7ª Vara do Trabalho de Florianópolis (SC)
determinou que as empresas telefônicas fossem oficiadas para juntar a
listagem de chamadas originadas e recebidas pelos telefones das partes e
de seus procuradores. A análise das listagens revelou a intensa
comunicação entre o autor da ação, o sócio da empresa e seu advogado,
inclusive na véspera da lavratura do auto de penhora sobre os bens.
O juiz definiu como "no mínimo incomum tão frequente contato entre duas
pessoas que contendem em processo judicial", e determinou a extinção da
execução ante a existência de conluio. Desde então, o ex-gerente vem
recorrendo dessa decisão, tendo como alegação principal a ilicitude da
prova relativa às ligações telefônicas.
A tese foi rechaçada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região
(SC). O acórdão regional esclareceu que não houve quebra de sigilo
telefônico porque, "em momento algum", houve pedido de fitas de
gravações das conversas mantidas entre as partes. Segundo o TRT, a
violação da intimidade ocorreria se houvesse captação das conversas, só
aceita em inquérito ou ação penal mediante autorização judicial.
Confusão de institutos
No recurso ao TST, o ex-gerente sustentou que a obtenção das provas
teria violado o artigo 5º, inciso XII, da Constituição da República, que
considera "inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações
telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último
caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer
para fins de investigação criminal ou instrução processual penal". Por
isso, todos os demais atos seriam nulos.
O relator do recurso, ministro Vieira de Mello Filho (foto), observou
que, de fato, os dados telefônicos foram essenciais para a solução da
controvérsia e para a formação do convencimento dos julgadores a
respeito da ocorrência de conluio fraudulento. No entanto, o TRT deixou
claro que não houve acesso ao conteúdo das ligações, mediante escutas,
mas apenas consulta aos registros - horário, data, duração e
destinatários das chamadas.
Para o
ministro, o ex-gerente, ao alegar violação da garantia do sigilo,
"confunde institutos". Ele explica que o sigilo telefônico - consistente
na proteção dos registros das chamadas recebidas e realizadas pelo
particular - é garantido, assim como o sigilo bancário e fiscal, pelo
artigo 5º, inciso X da Constituição, que trata da proteção à intimidade.
O artigo XII, indicado como violado no recurso, trata da
inviolabilidade da comunicação telefônica e protege a comunicação em si,
e não seus registros – ou seja, o conteúdo das conversas.
Citando diversos precedentes do Supremo Tribunal Federal, Vieira de
Mello Filho concluiu que "a discussão acerca do procedimento observado
pelo magistrado de primeiro grau para determinar a quebra do sigilo
telefônico das partes é discussão que, sob o prisma das estreitas
hipóteses de cabimento do recurso de revista em fase de execução, não se
faz à luz do artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal, único
invocado pela parte". A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso.
(Carmem Feijó/MB)
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