Desconsideração da Pessoa Jurídica, para atingir os bens dos sócios e administradores, em Clubes de Futebol
Os atletas profissionais de futebol são empregados, e, desta forma, aplica-se a Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, bem como a CLT – Consolidação das Leis do Trabalho.
Em havendo pendências trabalhistas a serem pagas, e o Clube de Futebol não tendo bens para honrar seus compromissos com os atletas (seus empregados), poderá ser utilizada a CLT, indiscriminadamente, para atingir os bens dos sócios e ou administradores?
Digo indiscriminadamente, pois a CLT, no artigo 10-A, dispõe que (após a Reforma Trabalhista):
“O sócio retirante responde subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas da sociedade relativas ao período em que figurou como sócio, somente em ações ajuizadas até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, observada a seguinte ordem de preferência:
I - a empresa devedora;
II - os sócios atuais; e
III - os sócios retirantes.
Parágrafo único. O sócio retirante responderá solidariamente com os demais quando ficar comprovada fraude na alteração societária decorrente da modificação do contrato.”
Ou seja, se o sócio que saiu da empresa responde subsidiariamente, imagine o atual!
Fora isso, nas questões do disregard of legal entity, vem prevalecendo na área trabalhista a teoria menor, isto é, o artigo 28, §5º do CDC – Código de Defesa do Consumidor, que prevê – em síntese – que a mera inadimplência trabalhista possibilita a desconsideração da pessoa jurídica.
Mas, na seara do Direito ligado ao FUTEBOL, a lei 9.615/98, no parágrafo 11 do artigo 27, determina:
“§ 11. Os administradores de entidades desportivas profissionais respondem solidária e ilimitadamente pelos atos ilícitos praticados, de gestão temerária ou contrários ao previsto no contrato social ou estatuto, nos termos da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil”.
Portanto, existe uma norma específica – contra a regra geral, que é a CLT – a informar que não pode ser utilizada a teoria menor, supra referida.
Ademais, a Lei que instituiu a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica (nº 13.874/19), foi cirúrgica em alterar o artigo 50 do Código Civil, para constar que a desconsideração da pessoa jurídica só ocorrerá, para atingir os bens dos sócios, se “em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial”.
Com efeito, vale a pena a leitura do § 1º do artigo 1º da Lei 13874/19 (que alterou o Código Civil), ao afirmar que “o disposto nesta Lei será observado na aplicação e na interpretação do direito civil, empresarial, econômico, urbanístico e do trabalho nas relações jurídicas que se encontrem no seu âmbito de aplicação e na ordenação pública, inclusive sobre exercício das profissões, comércio, juntas comerciais, registros públicos, trânsito, transporte e proteção ao meio ambiente”. (grifei)
Logo, além da especialidade, há ainda a cronologia para espancar a antinomia presente entre a CLT e a Lei que regula o emprego dos atletas de futebol, bem como o Código Civil.
Portanto, à guisa de discussão, fica um posicionamento aqui de que os sócios e dirigentes de clubes de futebol só serão responsáveis solidariamente, após a desconsideração da pessoa jurídica, quando agirem com abuso da personalidade jurídica, ou pelos atos ilícitos praticados, bem como de uma gestão temerária, ou ainda quando seus atos forem contrários ao previsto no contrato social ou estatuto do Clube de Futebol.
Inaplicável, desse modo, a teoria menor para esta situação.
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